Auxílio - Paraquedas lançados por aviões americanos levam ajuda humanitária para as vítimas do terremoto: ONU critica operação

Ação agressiva dos EUA causa atrito com a ONU

Ocupação de aeroporto e forte presença americana no Haiti provocam críticas sobre falta de coordenação na distribuição de ajuda humanitária
Jamil Chade, correspondente em Genebra - Estadão

Oficialmente, panos quentes. Nos bastidores, uma guerra. A operação americana no Haiti causa mal-estar na ONU e a entidade é obrigada a declarar que o país ainda é "um Estado soberano". Os EUA controlam o aeroporto, definiram quem tem o direito de pousar e já têm no país mais soldados do que a missão de paz da ONU.

Quase 70% do orçamento da ONU para o Haiti vêm de Washington e é a bandeira americana que está hasteada no aeroporto de Porto Príncipe. Já a ONU, numa ofensiva midiática, tentou garantir ontem que a situação no Haiti está "sob controle". A organização e o governo americano assinaram um acordo determinando a prioridade para pouso de aviões com alimentos e remédios. Agências ligadas à ONU e outros governos vinham criticando Washington por dar prioridade a aviões militares.

A ONU tentou ontem apagar a imagem de que há falta de coordenação. "Sem os EUA, não temos operação", afirmou Elizabeth Byrs, porta-voz da organização. "Estamos trabalhando numa situação difícil. A coordenação humanitária é da ONU e todos reconhecem que ela tem o comando da operação. Mas a logística é americana e estamos trabalhando em cooperação. Graças a eles, a torre de controle do aeroporto funciona", disse Byrs.

Ela também negou que haja uma falta de coordenação entre forças da Missão de Estabilização da ONU no Haiti (Minustah), lideradas pelo Brasil, a polícia haitiana e as tropas americanas. "As autoridades francesas estão muito satisfeitas com essa cooperação", afirmou, em referência às críticas vindas de Paris.

Um dia antes, o ministro da Cooperação do presidente Nicolas Sarkozy, Alain Joyandet, protestou na ONU e exigiu que os EUA esclarecessem seu papel no Haiti. "Precisamos ajudar o Haiti, não ocupá-lo", disse. A forma de trabalhar dos americanos deixou a cúpula da ONU irritada, já que estão atuando como se estivessem em um local em guerra.


A ação mais criticada foi a decisão americana de lançar alimentos de helicópteros em algumas regiões, como se o desembarque fosse perigoso. Para a ONU, a imagem que isso passa é a de que a ajuda internacional não tem coragem de ir ao encontro das vítimas.

Da parte do governo haitiano, a ordem dada foi a de que todo os seus diplomatas pelo mundo insistissem que o governo existe e não há conflito diante da presença militar americana. "Muita gente falou que o governo desapareceu. Não é verdade. Claro, muitos funcionários de alto escalão foram vitimas, alguns morreram e alguns estão de luto. Mas governo existe", afirmou ao Estado o embaixador do Haiti na ONU, Jean Claude Pierre.

Sobre a bandeira americana que tremula no aeroporto da capital, Pierre tem uma explicação. "Isso foi um acordo entre nosso governo e os americanos. Não temos Exército e precisamos de soldados", disse. "Seis mil delinquentes fugiram da prisão após do terremoto. Precisamos de ajuda e é isso que os EUA estão fazendo."