Após ingressar na seleta lista de países com um porta aviões, o Brasil vai integrar um grupo ainda mais restrito, o das nações com um submarino nuclear. A previsão é que a embarcação esteja pronta para os primeiros testes de mar em 2023. Atualmente, o projeto passa pelas fases de construção do protótipo do reator nuclear e produção do combustível, que devem ser concluídas em dois anos.

Essas etapas são desenvolvidas no Centro Experimental de Aramar (CEA), unidade da Marinha localizada na cidade de Iperó, a 125 quilômetros de São Paulo. No local, visitado pela Reportagem de A Tribuna, é feita parte das atividades de pesquisa da Armada.

O CEA também abrigará instalações onde serão testados os equipamentos nucleares a serem implantados no submarino. Um dos futuros prédios, por exemplo, será um protótipo, em terra, do próprio veículo. De acordo com o projeto, nesse imóvel, serão recriados os ambientes da embarcação e será testado seu reator, responsável pela produção de energia que a movimentará.

“O nosso reator protótipo será utilizado para testar o projeto, ver se ele funciona de fato. Se funcionar, vamos reproduzi- lo exatamente igual e colocar a bordo do submarino. Se não, vamos fazer as modificações apropriadas para que a segurança e o desempenho sejam aqueles requeridos”, explicou o superintendente do Programa de Desenvolvimento de Submarino com Propulsão Nuclear da Marinha do Brasil, o contra-almirante e engenheiro naval Luciano Pagano Junior

Será a primeira vez que o Brasil construirá integralmente um reator nuclear. Os principais equipamentos para sua montagem foram adquiridos ao longo dos anos, já que a ideia de ter um submarino com esse tipo de propulsão surgiu no País há mais de duas décadas.

O primeiro submarino nuclear do mundo foi o Nautilus, fabricado pelos Estados Unidos em 1954. Quase 60 anos depois,apenas cinco países contam com esse tipo de embarcação – Rússia, China, Inglaterra e França, além dos Estados Unidos. Todos integram o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). A Índia também tem um projeto em andamento.

O grupo é mais seleto do que o dos países com porta-aviões, tipo de embarcação presente nas marinhas de dez nações atualmente.

SUBMARINOS
Segundo o contra-almirante Pagano Júnior, o submarino brasileiro será montado no estaleiro em construção nas proximidades do Porto de Itaguaí, às margens da Baía de Sepetiba, no litoral sul do Rio de Janeiro. Na área, também será implantada uma base naval. A estimativa da Marinha é que os empreendimentos sejam finalizados em meados de 2015.

Ao todo, serão investidos € 6,7 bilhões (cerca de R$ 15,4 bilhões, com base na cotação de ontem) na implantação de todo o projeto. Esse montante inclui os gastos com a construção da base naval, do estaleiro, do submarino nuclear (sem o reator) e de quatro submarinos convencionais. Estes últimos vão substituir os que a Marinha tem hoje e já estão com idade avançada – Tupi, Tamoio, Timbira, Tapajó e Tikuna. O primeiro deve ser lançado ao mar em 2017.

Assim como o submarino nuclear, os convencionais serão fabricados a partir de um contrato firmado com a França em 2008. Pelo acordo, os franceses são responsáveis pela construção dos equipamentos e da tecnologia não-nuclear.

MOTOR
A principal diferença entre os submarinos convencionais e os de propulsão nuclear está no motor. Enquanto o primeiro se movimenta graças a um motor a diesel, o segundo utiliza um reator nuclear.

O submarino brasileiro não usará armamento nuclear. Isso se deve, principalmente, ao Tratado de Não- Proliferação Nuclear (TNP), assinado pelo País em 1968 e que impede a uso dessas armas pela nação.

De acordo com o contra-almirante Pagano Junior, a construção de um submarino nuclear garante à Marinha novas condições para defender o mar territorial brasileiro. Para ele, a embarcação é um instrumento de trabalho de qualidade e eficiência. “É mais ou menos como você defender o seu forte apache com arco e flecha e, em seguida, passar para armas de fogo”, exemplificou.

São as características do motor que asseguram as principais vantagens dessa embarcação. O equipamento permite que o submarino permaneça meses submerso e ainda atinja uma maior velocidade. Os diferenciais são essenciais no caso de fuga ou perseguição a um inimigo. O tempo que ele ficará embaixo d’água dependerá apenas do estresse da tripulação.

“A vantagem do submarino em um conflito é que ele não é detectável enquanto está submerso. Já quando está fora, é totalmente vulnerável. O tempo de submersão é a proteção do submarino”, explicou.

O oficial reiterou ainda que o submarino é um fator inibidor para possíveis inimigos. “Do ponto de vista do que se entende que é o poder naval, o exercício da capacidade de defender, o submarino é peça fundamental”.

Tripulação é selecionada entre militares voluntários
A seleção dos tripulantes para os submarinos militares, tanto os convencionais como, futuramente, o nuclear, é feita por regime de voluntariado, explicou o contra-almirante Luciano Pagano Junior. Segundo ele, para ser um bom profissional a bordo deste tipo de embarcação, é preciso querer, já que oficiais e marinheiros são submetidos a um elevado estresse psicológico.

No caso específico do submarino nuclear, é justamente o comportamento da tripulação que determinará quanto tempo ele ficará submerso. Normalmente, a embarcação fica meses embaixo d’água, para a realização de missões. E para que os militares estejam preparados, será aplicado um treinamento bastante rigoroso, que vai durar mais de um ano.

“Eles precisam estar aptos a viver com companheiros, com uma tripulação que varia entre 50 e 80 homens, dependendo do tipo de submarino. E isso intimamente, pois é um espaço muito pequeno e limitado para compartilhar com essas pessoas o dia a dia”,disse o contra-almirante.

A Marinha já iniciou o processo de seleção para a tripulação. A preparação incluirá testes em câmaras hiperbáricas (onde a pessoa é submetida a uma pressão elevada) e missões em submarinos convencionais. “Tem toda uma cultura que é criada para que paulatinamente ele esteja preparado”.

Além do estresse psicológico, os tripulantes de um submarino nuclear costumam sofrer com o estresse profissional, informou Pagano Junior. Isso porque cada um tem sua função específica, executada sob o risco de “por a perder todos os tripulantes”. “Manobras erradas significam um grande desastre. É uma profissão estressante”, destacou.

A principal diferença no treinamentodas equipes de embarcações com propulsão nuclear está na parte técnica, ou seja, em como operar o reator com segurança. Nessa área, o Brasil conta com o apoio da França, parceiro do País na construção desse submarino. Segundo o contra-almirante, “há um acordo com a França que visa não treiná-los (os tripulantes) lá, mas sim, obter informações que permitam reproduzir esse treinamento no Brasil, com base na experiência de quem já faz isso há 20 anos”.

O centro de treinamento para aplicar essas instruções foi concluído em Aramar no ano passado. A parte prática dessa qualificação terá aulas realizadas no complexo do reator, onde será testado o equipamento. A intenção é que o tripulante chegue a bordo com conhecimentos significativos, disse Pagano Júnior. “Aqui, ele será supervisionado, estará em um ambiente mais controlado para aprender a operar na prática o reator de verdade”.

As dificuldades impostas aos tripulantes fará com que seja necessário um rodízio entre eles. Cada vez que o submarino retornar, um outro grupo embarcará em uma nova missão. “É para que se possa usufruir daquele submarino nuclear o máximo possível. É uma ferramenta muito cara. É prejuízo ficar parada”.

Fonte: NOMAR/DEFESANET