Um memorando classificado como urgente, segundo fontes militares
russas, foi expedido pelo escritório do presidente Vladmir Putin, nesta
quarta-feira, e ordena um ataque massivo da Rússia contra a Arábia Saudita caso as forças da Organização do Tratado Atlântico Norte (Otan,
na sigla em inglês) ataquem a Síria. A informação, não foi confirmada
oficialmente pelo governo russo, conteria instruções semelhantes a uma
ordem de guerra, expedida há cerca de um mês por Riad, na qual o governo
muçulmano teria declarado que, caso a Rússia não aceitasse a
derrota de Bashar Al Assad, os sauditas iriam arregimentar militantes na
Chechênia para “aterrorizar” os XXII Jogos Olímpicos de Inverno que a Rússia realizará na cidade de Sóchi.
Fontes militares russas também informaram, nesta manhã, que uma
flotilha, liderada pelo contra-torpedeiro Almirante Chabanenko,
aproxima-se do porto sírio de Tartús. Segundo informes lidos pela rádio
militar israelense Debka, desde o último sábado o exército
russo está em estado de alerta frente a um possível ataque dos EUA,
Grã-Bretanha e França contra a Síria. Segundo a agência russa de
notícias RNA, além da Rússia, outros países aliados dos sírios recusam-se a colaborar com os planos bélicos do Ocidente.
Em Nova York, nesta tarde, ocorria uma reunião fechada dos membros
permanentes do Conselho de Segurança da ONU (Rússia, Reino Unido, China,
França e EUA) sobre a situação na Síria. A reunião foi convocada por
iniciativa dos Estados Unidos. Sabe-se também que a lista de
participantes ainda poderá ser expandida nas próximas horas e o centro
da discussão é um projeto de resolução britânico sobre o possível uso da
força contra Damasco. Mais cedo, o vice-ministro do Exterior russo,
Guennadi Gatilov, declarou que, se qualquer país usar a força contra a
Síria, contornando o Conselho de Segurança da ONU, isso poderá ser
considerado como uma flagrante violação do direito internacional.
Mas o possível bombardeio dos EUA e demais potências ocidentais, que
poderá ocorrer dentro de mais algumas horas, não será uma atividade
turística no Oriente Médio. Ao contrário do que ocorreu com Gaddafi, na
Líbia, o governo de Damasco não está isolado. Potências nucleares como
Rússia e China podem transformar a ação bélica norte-americana em “um
passeio no inferno”, segundo aquelas fontes militares russas. Na ONU,
ambas as nações asiáticas já vetaram qualquer ataque ou manobra militar
contra os sírios. Depois, o Irã, maior potência militar do Oriente
Médio, com um exército regular de dois milhões de militares efetivos e
mais um milhão de guerreiros muçulmanos mobilizados, fundamenta sua
sobrevivência regional na existência do regime de Damasco.
Em terceiro lugar, ainda segundo a RNA, Israel, o terceiro braço da Otan
na região, encontra-se cercado por forças do Hezbolah, aliados de Síria
e Irã, por um lado, e por mísseis e forças em terra do Hamas, na Faixa
de Gaza; além do exército sírio, com aviões e mísseis de médio alcance.
Mesmo o Iraque, com um governo xiita, é aliado preferencial do Irã e já
negou seu espaço aéreo a qualquer incursão militar contra a Síria.
“Em quarto lugar, qualquer intervenção militar estrangeira na Síria
desataria uma ação dos curdos contra a Turquia, aliado das forças
ocidentais”, segue a agência russa de notícias, em análise divulgada
nesta quarta-feira. E, por último, o Egito, hoje controlado por
militares aliados dos EUA e Israel, poderá mergulhar em uma divisão
anárquica, protagonizada por diferentes grupos islâmicos
fundamentalistas, ainda dispersos por uma coalizão de forças que mantém o
país unificado. Ao menor sinal de distúrbios na Síria, o Irã também
poderá bloquear o Estreito de Ormuz, por onde escoam cerca de 40% de
todo o petróleo consumido nos EUA e Europa.
Provas em contrário
Ao contrário do que afirmam a Casa Branca, em Washington, e o número
10 da Downing Street, em Londres, não há provas contundentes de que a
ordem para o ataque com armas químicas à região ocupada por rebeldes, na
Síria, tenha partido de Damasco. Nesta quarta-feira, segundo o
especialista militar Joseph Watson, do Infowar, um sítio na
internet especializado em estratégias militares, o panorama ficou ainda
mais embaçado com o vazamento de um telefonema interceptado pela
inteligência israelense. Segundo o serviço de inteligência de Jerusalém,
a ordem para um ataque com armamento químico não teria partido do
Ministério da Defesa de Assad, pois o ministro Moshe Ya’alon, em pessoa,
teria telefonado, em pânico, para a unidade de armas químicas do
exército sírio em busca de notícias sobre o uso de gás de nervos, em uma
ação que teria matado cerca de mil pessoas, apenas uma hora depois de
veiculada a notícia pelas agências internacionais.
“Por que o ministro sírio da Defesa faria um telefonema desesperado,
no qual ‘exigia respostas imediatas’ para o ataque com armas químicas se
fosse ele quem o ordenou”, questiona o informe da inteligência de
Israel, publicado no Infowar. “O fato de que o alto comando do
governo sírio aparentemente não sabia do ataque sugere, fortemente, que
eles não deram a ordem para tanto, em um cenário no qual a liberação do
agente químico teria sido realizado pelos próprios rebeldes ou por
‘oficiais sírios que agiram por conta própria, acima das ordens de seus
superiores”, acrescentou o especialista do site Foreign Policy Noah Shachtman.
Um oficial de inteligência dos Estados Unidos também disse ao Foreign Policy
que todos no Pentágono estão querendo, até agora, entender exatamente o
que houve mas, seja lá quem ordenou o ataque, “fez uma coisa realmente
estúpida”. Se, mesmo sem saber exatamente o que houve de verdade, porque
o ataque aconteceu e quem o ordenou, sem que os técnicos das Nações
Unidas investiguem o incidente, os EUA lançarem um ataque de mísseis
contra a Síria, “potencialmente inflamará toda a região”, acrescenta
Shachtman.
Para deixar a situação ainda mais confusa, há evidência prévias que
sugerem a participação de rebeldes, com o apoio norte-americano, no
preparo e uso de armas químicas em numerosas ocasiões, completamente
esquecidas devido ao rumo dos acontecimentos. Na última vez que a ONU
investigou evidências de uso de armas químicas na Síria, os inspetores
concluíram que parecia obra dos rebeldes e não das forças regulares do
regime de Assad.
“Em adendo, conversas telefônicas vazadas entre integrantes do (exército rebelde) Free Syrian Army
revelaram detalhes de um plano para a liberação de armas químicas em um
ataque capaz de impactar uma área de cerca de um quilômetro”,
acrescenta o Infowar.
O vice-chanceler sírio, Faisal Maqdad, também disse, nesta
quarta-feira, que Estados Unidos, Grã-Bretanha e França ajudaram
“terroristas” a usar armas químicas na Síria, e que os mesmos grupos vão
em breve atacar a Europa com essas armas. Falando a repórteres do lado
de fora do hotel Four Seasons em Damasco, Maqdad disse que apresentou
provas aos inspetores de armas químicas da ONU de que “grupos
terroristas armados” usaram gás sarin em todos os locais dos supostos
ataques.
– Nós repetimos que grupos terroristas são aqueles que usaram (armas
químicas) com a ajuda dos Estados Unidos, Reino Unido e França, e isso
tem que parar. Isso significa que essas armas químicas serão usadas em
breve pelos mesmos grupos contra o povo da Europa – acrescentou.
Ainda assim, os navios da Marinha de Guerra dos EUA e da Frota Real
do Reino Unido que estão no leste do Mediterrâneo, possivelmente,
efetuarão um ataque aéreo contra alvos na Síria já na noite de quinta
para sexta-feira, logo depois da votação no parlamento britânico em
apoio da operação militar contra o regime sírio, informa a imprensa e
televisão norte-americanas. Pressupõe-se que o ataque pode durar várias
horas, entre objetivos principais citam unidades do Exército da Síria
que podem potencialmente usar armas químicas, bem como os
Estados-Maiores, centros de comunicação e complexos de lançamento de
mísseis, afirma a mídia, se referindo a uma fonte anônima no Pentágono.
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