Programa nuclear faz País enfrentar boicote, diz ministro
Sérgio Rezende, da Ciência e Tecnologia, revela que alguns governos têm se negado a vender componentes ao Brasil

O ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, disse ontem que o País já vem enfrentando uma espécie de boicote por causa da determinação do governo de atingir a autonomia no programa nuclear, desenvolvendo tecnologias para dominar o ciclo do elemento combustível (que abastece as usinas de Angra 1 e 2).

"Há vários componentes do programa nuclear e espacial que o Brasil não consegue dos países que detêm essa tecnologia por motivos que todos entendemos. Não podemos ficar temerosos do que pode acontecer. Mas já estamos enfrentando em muitos aspectos essa questão. É quase um boicote", afirmou. Ele não disse quais são os países que se negam a vender para o Brasil.

O Estado mostrou ontem que o governo federal deu fôlego ao programa nuclear brasileiro, com o anúncio de investimento de R$ 850 milhões para a construção de um novo reator em Iperó (SP).

Rezende inaugurou no Rio um laboratório que produzirá, em escala pré-industrial, liga de zircônio, material com que são fabricadas as varetas que armazenam pastilhas de urânio enriquecido. Esse conjunto de tubos é o que se chama de elemento combustível dos reatores nucleares.

O Laboratório Multiusuário de Fusão a Arco custou R$ 4,4 milhões e foi desenvolvido em parceria entre a Coppe, programa de pós-graduação em engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, as Indústrias Nucleares do Brasil (INB) e o Instituto Militar de Engenharia.

As usinas de Angra 1 e 2 precisam, juntas, de 3,6 mil tubos para gerar energia. A cada recarga anual, um terço desses tubos é substituído. As varetas de liga de zircônio custam, em média, 15% do valor do elemento combustível. "A produção dessa liga é estratégica. Se detenho a tecnologia, posso discutir preço com os produtores internacionais. E se houver restrição no mercado, eu não dependerei dos fornecedores internacionais, poderei reagir rapidamente", afirmou Samuel Fayad, diretor de Produção do Combustível da INB.

Restrição. Essa restrição no mercado já ocorreu. Na década de 1980, a Westinghouse, fabricante das peças de Angra 1, deixou de fornecer o elemento combustível para a usina. "Tivemos problemas com Angra 1 e fomos buscar uma solução com a Siemens, na época em que iniciava o acordo Brasil-Alemanha. Hoje há uma estabilidade no mercado", explicou Fayad. Na fase industrial, o que deve acontecer em cinco anos, a INB produzirá os tubos, provavelmente em parceria com a iniciativa privada.

O laboratório tem ainda capacidade para produzir ligas de titânio e níquel, usadas pelas indústrias nuclear, química, aeroespacial, biomédica e de petróleo.

Fonte: Estadão