O secretário-geral da NATO, Anders Fogh Rasmussen, considera que a intervenção no Afeganistão foi um erro, na medida em que a Aliança Atlântica subestimou o desafio e não disponibilizou os recursos necessários.

“Em retrospectiva, penso que subestimámos o desafio e a nossa operação no Afeganistão não dispunha de recursos suficientes, nesse sentido a minha resposta é que sim, que foi um erro”, admite o responsável, em entrevista à Renascença e ao "Expresso".

“Agora mudámos de estratégia, deslocámos mais tropas e iniciámos as missões de treino e esta é uma das lições aprendidas no Afeganistão quando olhamos para o futuro. Devíamos ter estabelecido essa missão mais cedo, ela leva apenas um ano mas alcançámos resultados significativos. E a lição aprendida é que devemos ter uma capacidade permanente para treinar e educar forças de segurança locais, penso que isso será uma parte integrante de gestão de crises no futuro. Iniciámos esse exercício muito tarde, mas mais vale tarde do que nunca. Estamos agora no caminho certo e é por essa razão que estou bastante optimista em relação à nossa operação no Afeganistão e vamos fazer esse anúncio positivo em Lisboa, de que a transição está prestes a iniciar”, afirma o secretário-geral da NATO.

Não obstante este reconhecimento, Anders Fogh Rasmussen diz-se agora optimista e considera que a Cimeira de Lisboa vai poder assinalar o princípio do fim do envolvimento da Aliança no conflito. Na capital portuguesa será confirmado o início da retirada no próximo ano, mas o desenrolar da mesma dependerá da capacidade das forças afegãs.

“A segurança militar é muito importante e é um pré-requisito para o desenvolvimento civil. Mas o desenvolvimento civil é outro pilar muito importante se quisermos garantir paz e estabilidade de longo prazo no Afeganistão”, defende.

Novo começo com a Rússia

Para o ex-primeiro-ministro dinamarquês, o encontro na capital portuguesa vai igualmente assinalar um recomeço nas relações entre a NATO e a Rússia. Vinte anos depois do fim da União Soviética, o secretário-geral da organização considera que está na altura de enterrar o machado de guerra da Guerra Fria.

“Sim, efectivamente, considero que se trata de começar de novo, penso que vamos entrar numa nova fase de cooperação entre a NATO e a Rússia. Não consideramos a Rússia uma ameaça e acredito que os russos não consideram a NATO uma ameaça. Com base nisso devemos desenvolver uma verdadeira parceria bem sucedida ao longo dos próximos anos.”.

Afeganistão, luta contra o terrorismo e a pirataria e a defesa anti-míssil são algumas áreas em que Anders Fogh Rasmussen espera mais cooperação.

Em entrevista à Renascença, Rasmussen diz compreender as desconfianças que persistem, sobretudo entre alguns dos Estados membros da Aliança do Leste da Europa. Mas reitera que estes são precisamente estes países que mais têm a ganhar com o normalizar das relações com a Rússia.

“Uma verdadeira parceria estratégica entre a NATO e a Rússia vai melhorar o ambiente de segurança estratégica na área euro-atlântica e isso será claramente em benefício dos países do Centro e Leste da Europa”, sustenta.

Um dos testes à nova relação será o sistema de defesa anti-míssil que a NATO adoptará em Lisboa. O secretário-geral da organização garante que a proposta que será aprovada não vai identificar nenhum país como ameaça específica e manifesta abertura para cooperar com Moscovo, admitindo mesmo a co-existência articulada dos sistemas anti-míssil dos ex-inimigos da Guerra Fria.

“O que faremos na reunião NATO-Rússia é iniciar uma análise conjunta sobre como podemos implementar uma cooperação prática sobre defesa anti-míssil. Mas para ser claro, o que eu prevejo é dois sistemas separados, da NATO e da Rússia, que cooperam e um elemento dessa cooperação é a troca de dados e informações. E é através dessa troca que podemos tornar todo o sistema mais eficiente e com melhor cobertura”, afirma o responsável.

Austeridade também chega à NATO

Em Lisboa, os países da Aliança vão igualmente aprovar o modelo da nova estrutura de comando, com o objectivo de reduzir recursos e despesas, embora a decisão sobre a localização geográfica das novas estruturas deva acontecer apenas em 2011.

Rasmussen explica os objectivos desta reforma, mas evita comprometer-se com quaisquer garantias quanto à manutenção do actual comando de Oeiras, tal como pretende o Governo português.

Apesar da austeridade que Portugal e muitos outros países enfrentam e que afecta igualmente os orçamentos da defesa, Rasmussen acredita que isso não prejudicará o empenho destes países na Aliança e a capacidade de intervenção da mesma. E recusa terminantemente pronunciar-se sobre a aquisição dos submarinos decidida por Portugal.

“Não vou interferir com decisões nacionais sobre investimentos de Defesa. Mas estou confiante que Portugal pode e vai estar à altura dos seus compromissos no seio da nossa Aliança”, refere o secretário-geral da NATO.

Anders Fogh Rasmussen considera ainda que a Cimeira de Lisboa vai dotar a NATO de um conceito estratégico válido para os próximos dez ou 12 anos e estima que, face às novas ameaças identificadas pela organização, a Aliança Atlântica continua a fazer hoje tanta falta como quando foi fundada em 1949.